O Perigo de Uma História Única


"A história única cria estereótipos, e o problema com os estereótipos não é que sejam mentira, mas que são incompletos. Eles fazem com que uma história se torne a única história."
Chimamanda Ngozi Adichie


Chimamanda Ngozi Adichie nasceu em 15 de setembro de 1977, em Enugu, na Nigéria. 

Ela é a quinta filha de seis irmãos, de Grace Ifeoma e James Nwoye Adichie. Grace e James eram funcionários da Universidade da Nigéria, em Nsukka. Grece era administradora e James professor de estatística.

De classe média, Chimamanda sempre foi boa aluna, e estudou na mesma universidade que seus pais trabalhavam antes de ir para os Estados Unidos aos 19 anos, para cursar graduação em comunicação e ciências políticas na Eastern Connecticut State University, e depois ela defendeu seu mestrado em escrita criativa na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, também nos Estados Unidos.

Em 2003 ela publicou Hibisco Roxo, que foi muito bem recebido por crítica e público, e recebeu vários prêmios importantes.

Seu segundo romance, Meio sol amarelo, foi publicado em 2006, e assim como Hibisco Roxo foi um sucesso, recebendo vários prêmios literários.

Em 2008, a autora defendeu outro mestrado, dessa vez em estudos africanos pela Universidade Yale.

Entre 2011 e 2012, ela recebeu uma bolsa da Universidade Harvard, para escrever o romance Americanah, que foi publicado em 2013. 

Americanah, foi eleito um dos dez melhores livros do ano pelo New York Times Book Review e foi vencedor do National Book Critics Circle Award, e teve os direitos para o cinema adquiridos pela atriz de Hollywood, Lupita Nyong’o. 

A obra da autora foi traduzida para mais de trinta línguas.

Chimamanda é bestseller no mundo todo e é quase uma estrela pop. Ela é a possivelmente a mais destacada escritora anglofona-africana, e seus argumentos sobre o perigo de uma história única são muito bons.

Então, o que vem a ser essa história única?

A Chimamanda explica de forma bem simples, e por meio de exemplos.

E eu vou falar apenas sobre três exemplos.


Primeiro Ela diz que quando começou a escrever, com sete anos de idade, ela escrevia exatamente o tipo de história que ela lia, e em consequência disso, todos os personagens que apareciam nas suas histórias eram brancos de olhos azuis, brincavam na neve, comiam maçãs e falavam muito sobre o tempo e sobre como era bom o sol ter saído.

Embora ela fosse uma criança nigeriana, ela escrevia histórias sobre crianças européias, e os personagens adultos também eram adultos europeus.

Como ela só tinha lido livros nos quais os personagens eram estrangeiros, ela acreditava que os nigerianos não podiam ser personagens de livros.  

Ela achava que a literatura de verdade era aquela que aparecia nos livros europeus, e que todos os livros deviam imitar isso para serem literatura de verdade 

Mais do que isso, ela achava que personagens negros, iguais a sua mãe, seu pai, seus irmãos, seus vizinhos e ela mesma não podiam ser personagens de livros.

O entendimento dela só foi começar a mudar quando ela descobriu os escritores africanos. Aí ela percebeu que pessoas com a pele cor de chocolate também podiam ser personagens de livros.

E quando ela via personagens iguais a ela nos livros ela podia se identificar.

Os negros podiam sim ser personagens de livros, escritores de livros, contar suas histórias, ter o seu próprio ponto de vista.

Mas, mesmo que ela gostasse dos livros europeus que ela lia, a realidade é que esses livros contavam uma história única, e na história a única não havia pessoas negras, pessoas que viviam num país tropical como a Nigéria, por exemplo.

Saber da existência de escritores africanos salvou chimamanda de acreditar na história única de que só existia a literatura europeia ou norte-americana.

Mas ela continua dando exemplos disso.

No segundo exemplo ela fala que quando ela tinha cerca de oito anos de idade um garoto foi trabalhar na casa dela, ele era de uma família muito pobre e em certa ocasião a família dela foi visitar a família do menino, em uma aldeia muito pobre.

A mãe desse garoto pobre mostrou para a família de Chimamanda um cesto de palha pintado com uns desenhos muito bonitos que o irmão do garoto tinha feito. 

Ela ficou espantada. Como alguém tão pobre podia fazer uma obra de arte tão bonita?

Ela só tinha ouvido falar sobre como aquela família era pobre, então ficou impossível para ela vê-los como qualquer coisa além de pobres.

Novamente Ela viu o efeito da história única. Como a única história que ela tinha ouvido falar era da pobreza extrema daquela família, que ela foi visitar, não tinha como ela imaginar que eles poderiam ser também artistas.

Era como se eles tivessem o esteriótipo de ser pessoas pobres e por isso eles não podiam ser nada além de pobres.

No terceiro exemplo, ela fala de quando saiu da Nigéria para fazer faculdade nos Estados Unidos. 

A sua colega de quarto americana ficou chocada com ela. 

Ela perguntou onde Chimamanda tinha aprendido a falar inglês tão bem, tão perfeito, e ficou confusa quando ficou sabendo que a língua oficial da Nigéria era o inglês. 

Essa mesma moça também perguntou se podia ouvir o que chamou de “música tribal”, e ficou muito decepcionada quando viu que a música tribal que ela achava que os nigerianos ouviam era a música da Mariah Carey.

Essa menina tinha uma ideia preconcebida do que era um africano, da música que um africano escutava, em fim, ela sabia muito pouco ou quase nada sobre a África. Ela tinha uma história única sobre a África, de pessoas pobres, de pessoas que viviam em tribos, etc…

Na verdade, essa garota já sentia pena da Chimamanda antes de conhecer ela. 

Sua postura era uma espécie de pena condescendente e bem-intencionada era mais ou menos como se assim que a pessoa se apresente a eu sou africana a outra já diz assim ai tadinha que pena.

No livro tem vários outros exemplos de como uma história única pode ser muito perigosa e pode fazer com que as pessoas sejam muito estereotipadas a gente mesmo tem que ter muito cuidado para não reduzir as pessoas a esteriótipos principalmente nós que queremos escrever história não podemos querer escrever a história única.

O que podemos fazer para vencer o perigo da história única, sendo escritores brasileiros?

Uma maneira é não querer escrever apenas personagens que se chamam Mary, ou John, ou que tenham outros nomes que são americanos ou europeus.

Não precisamos escrever histórias que se passam apenas em Nova York e Londres.

Podemos escrever histórias que se passam aqui no Brasil e que são vividos por personagens que tem nomes brasileiros

Nós podemos contar a história do brasileiro, sem necessariamente ficar esperando que outras pessoas formem a ideia do que é ser um brasileiro, do que é morar na periferia, e assim por diante.

Já existe uma história única formada sobre pobres, sobre pessoas que moram na favela, nós devemos escrever as nossas histórias numa tentativa de reduzir a força dos estereótipos que já existem, e não alimentá-los ainda mais.

De forma específica, para a ficção científica, uma história única é a história que nós já conhecemos de milhares de filmes, séries e livros, onde os alienígenas sempre chegam nos Estados Unidos, onde apenas os nerte-americanos estão produzindo todo o desenvolvimento tecnológico que existe no mundo, que os cientistas não podem ser brasileiros, ou argentinos, bolivianos, enfim você pode enriquecer muito a sua história se fugir da história única, dos clichês e estereótipos, que como disse Chimamanda Adichie, não é que não sejam verdade, é que são incompletos.

O livro O perigo de uma história única é uma adaptação da primeira palestra proferida por Chimamanda no TED Talk, em 2009.

Atualmente, o vídeo é um dos mais acessados da plataforma, com mais de 18 milhões de visualizações.

Você pode assistir a ele legendado ou dublado em português no YouTube.

Valeu muito a pena o livro e a palestra O Perigo de uma história única, de Chimamanda Ngozi Adichie.





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